O Herdeiro e o Mensageiro
Havia participado daqueles ritos por
tantas vezes que minha memoria havia se esquecido do numero e ainda assim não
conseguia me acostumar em ter que cortar a palma de minha mão e deixar o sangue
escorrer para uma pira de fogo que exaltava um fedor insuportável. Quando as
primeiras gotas caíram na pira o fogo cresceu como se alimentado pela energia vital
contida em meu sangue e dançou como se tivesse tomado vida própria.
E não conseguia ver nada.
- Não se preocupe jovem mestre – disse
um dos mais velhos de nossa ordem e encarregado daqueles rituais – Leva-se
muito tempo para poder ver o que existe dentro das chamas, o futuro não é
revelado antes que a pessoa se torne digna de vê-lo.
- Como posso herdar a ordem se não
consigo exercer os meus deveres? Odeio duvidar das palavras de nosso Abençoado
Val the’l, mas não vejo porque deveria suceder seu trono. Dorum não me ama.
- Dorum ama a todos - repreendeu o
mestre dos rituais – Mas tudo tem seu tempo.
Apertei meu punho cortado e joguei
mais sangue dentro da pira e tudo o que consegui foi perder mais do meu
precioso sangue.
As portas da câmera de rituais foram
abertas e um jovem invadiu o aposento apreçado.
- Jovem mestre, mestre dos rituais –
ele abaixou a cabeça em comprimento e quando o mestre dos rituais sinalizou
para ele se erguer, o jovem ofegante me encarou – Nossa excelência o Abençoado
requer sua presença, com urgência.
Sai sem deixar que os dois falassem
qualquer coisa, estava a tempos na ordem e mesmo sendo escolhido para
sucede-la, não conseguia me acostumar com a forma ridícula que todos se
comportavam. Odiava os títulos, odiava a educação exagerada e forma pomposa que todos fingiam falar.
Passei pelos corredores de mármore branco que ligavam a câmera dos rituais ao salão principal. No caminho haviam
muitos acólitos e mestres da ordem, mas nenhum deles ousou falar comigo pois
meu ódio e raiva estavam estampados em meu rosto, por isso eles se contentavam
em me reverenciar e ficar calados.
O salão estava quase vazio, o que era
raro. Era comum ver dezenas de acólitos perguntando a Val sobre os segredos de
nossa fé, sobre o mundo e sobre Dorun ou sua esposa Elf’el.
- Orl’har Mai Dorum – falei como era o costume ao ficar na presença daquele homem. Dizíamos aquela frase para quase
tudo.
- Orl’har Mai Dorum – respondeu Val que
me encarava com um olhar preocupado e isso era algo raro de se presenciar.
Val estava sentado em seu trono de
ouro, trajando suas vestes brancas e simples. Mesmo sendo nosso líder, ele abdicou de qualquer luxo e se vestia como qualquer acolito. Uma batina branca
e uma corda preta amarrada a cintura.
Ao seu lado estavam dois homens, que
alem da batina vestiam uma túnica e algumas pedras preciosas presas ao seu
cinto, que indicavam seu status dentro da ordem. Eram Carmiron e Jaspiron,
irmãos gêmeos que cresceram dentro da ordem e ascenderam ao conselho dos dez,
um grupo seleto que cuidava da ordem em nome de Val.
- Abistam – falou Val e sua voz
denunciava sua preocupação e isso me incomodava – Dorum me enviou um sinal, uma
mensagem triste e preocupante.
Fiquei em silencio encarando-o e
imaginando o que poderia ter deixado-o naquele estado.
- Uma grande sombra paira sobre o
mundo e a luz de Dorum esta sendo coberta por ela. Uma guerra de proporções
nunca antes vistas vai cobrir o mundo dentro de pouco tempo e temo pelo que
possa acontecer.
O mundo sempre estava coberto por um
sombra e o mundo sempre estava em guerra, cada uma sempre maior que a outra.
Para mim isso não passava de exagero.
- Tenho sonhado com minha morte, com a
morte de nossos irmãos e com a queda de nossa fé. Tenho visto nas chamas um
homem, mas sua imagem é confusa e não sei quem é ou seu papel nesses eventos –
ele respirou profundamente procurando as palavras para continuar – Os tempos
estão acabando e você ira assumir o trono em breve, pois meu tempo é curto
neste mundo.
- Você ainda vivera por muitos anos –
falei sem esconder minha descrença com o que estava ouvindo e enquanto os dois
anciões desejavam me repreender, Val apenas suspirou como um pai que vê um
filho cometendo um erro e sabe que esse mesmo erro é que deve ensina-lo sobre
o que é correto.
- Abistam, você sempre foi mais
rebelde e o mais descrente de todos os que já passaram por essa ordem, mas existe
bondade em seu coração e sinto que Dorum te abençoou mais do que qualquer um de
nós. Você ainda vai entender – Val fez um sinal para os dois, que pegaram uma
caixa posta sobre a mesa perto do trono. Carmiron retirou uma espada de dentro
da caixa e a entregou a mim após se ajoelhar na minha frente – Esta é a sagrada
espada de nossa ordem, a arma dada a nosso fundador pelo próprio Dorum para que
ele lutasse com as trevas quando a hora chegasse. Ela é sua.
Fiquei inquieto enquanto segurava o
cabo da espada, podia sentir a energia que emanava daquela lamina e tinha
certeza de que ela não era desse mundo. A espada tinha uma cor branca como
leite e as vezes parecia emanar uma aura dourada. Sua guarda e seu punho eram
feitos de ouro e havia uma âmbar vermelha no pomo em forma de grifo.
- Com minha morte eu lhe deixarei uma
ultima missão, caminhe pela terra, converta os infiéis e forme o maior exercito
já visto, o exercito de nosso senhor que carregara sua luz e banira o mal que
recai sobre esse mundo. Você tem a maior missão dada a um de nos, de unir os
povos e derrotar nossos inimigos.
- Eu... – Não conseguia encontrar as
palavras certas para descrever o que estava sentido e pensando sobre tudo
aquilo, ao mesmo tempo que me parecia uma loucura de um velho senil, sentia o
peso do destino sobre minhas costas – Não sei se posso.
- Você pode, só você pode. Quando eu
morrer, você partira com um grupo seleto de meus melhores homens e começara sua
cruzada. O tempo é curto.
Com aquelas palavras, ele fez um sinal
para que o deixasse a só. Levei a espada para meus aposentos pensando sobre
tudo o que havia acontecido e encantando com o poder que sentia ao lutar contra
um inimigo imaginário.
Passei a noite meditando em frente a
chama de minha lareira e quando o dia havia chegado, o sino de nossa ordem
havia soado e eu soube antes de qualquer um me dizer que Val havia falecido e
descansava no Hall das mil almas.
Querendo ou não, minha cruzada havia
começado.
Parabéns pela história está realmente muito boa! Eu faço um trabalho parecido com o seu nesse blog:
ResponderExcluirwww.aquedademanaleen.blogspot.com.br
Então creio que possamos criar algum tipo de parceria, o que acha?