Metal e Sangue
Era uma noite como qualquer outra daquela
época do ano, escura e úmida, onde não se podia encontrar qualquer alma viva
aquela hora da noite. O que a tornava perfeita para moldar o aço e dar a vida a
novas armas.
Não gostava de ter contato com as
outras pessoas do vilarejo, sempre fui um homem de poucos amigos e por isso
preferia trabalhar na calada da noite, com a lua como minha única companheira.
Construí minha casa e minha forja em
um local um pouco mais afastado do que o resto do vilarejo, dessa forma não
incomodaria ninguém durante a noite e poderia trabalhar em paz. O que era
perfeito naquela ocasião, pois estava forjando uma nova espada e se tudo
ocorresse como esperado, se tornaria minha obra prima.
Ouvi o som da lamina quente chiando
quando colocada em água fria que se misturou aos raios, me impedindo de ouvir o
som da batida em minha porta. Foi somente quando ela se abriu e um homem caiu
para dentro dos aposentos que me dei conta que havia alguém ali.
- Mas o que?
- Ajude-me – disse o homem com uma voz
fraca e pelo que percebi ele havia cuspido um pouco de sangue ou estava ferido,
mas não conseguia ter certeza, pois ele estava de costas para o chão e com um capuz
que cobria todo seu rosto e só podia ver a mancha de sangue que se espelhava
pelo chão.
Pela forma que falava ele não era um camponês, mas jamais iria imaginar ter aquela pessoa caída no chão gelado de
minha forja, coberto de sangue e quase morrendo.
- Pela rainha, o que você esta fazendo
aqui? – Disse espantado ao vira-lo e ter seu rosto revelado por um raio que
caiu a poucos metros da minha porta, iluminado todo o lugar. Em meus braços
estava o maior general de todo o reino, Augusto Van Daibergerg, o lobo negro.
Um rosnado ecoou pelo aposento e
quando olhei para a porta, seu lobo negro entrou rosnando enquanto molhava meu
chão de água e sangue.
- Tudo bem Sombra, ele não vai... –
Augusto desmaiou enquanto tentava terminar sua frase, mas para minha sorte seu
lobo pareceu entender e sentou-se emitindo um som que podia jurar ser de choro.
Minha mente estava confusa, não sabia
se me ocupava em ajuda-lo, se me preocupava com aquela enorme fera sentada a
poucos metros de distancia ou se tentava entender o que estava acontecendo. Por
fim, consegui retirar sua armadura, despi-lo e coloca-lo em minha cama, quando
notei uma seta de um flecha em sua barriga, com a haste quebrada.
Seu lobo se aproximou enquanto eu
removia a flecha cuidadosamente, por sorte ela não entrou fundo na carne e pude
remove-la, mas pelo jeito ele estava com ela a alguns dias e seu corpo estava
quente como brasa. Por alguns segundos fiquei com medo que ele fosse me atacar
por estar mexendo em seu dono, mas Sombra ficou quieto lambendo suas próprias feridas e chorando.
Tentei limpar o ferimento da melhor
forma que pude enquanto pensava no que fazer a seguir e quando me dei conta, já
estava amanhecendo.
Não muito depois do sol nascer, ouvi o
barulho de alguém batendo em minha porta de forma agressiva e soube que nada de
bom podia vir disso. Peguei o meu martelo de forja e abri a porta pronto para o
pior. Do outro lado, haviam três cavaleiros trajando armadura completa, porem
muito danificada e ainda suja, o que indicava que eles haviam lutado a pouco
tempo.
- Ferreiro – disse um deles, apesar de
não conseguir ver seu rosto, pois todos estavam com seus elmos fechados – Nos
estamos procurando um homem, um fugitivo, por uma caso não viu ninguém suspeito
ou ferido por aqui?
- Sempre existem pessoas suspeitas
andando por aqui, mas não me lembro de nenhum ferido – menti, entendendo um
pouco melhor o porquê de um dos maiores homens de todo o reino ter caído quase morto
em minha forja.
- Neste caso, o senhor não se
importaria que olhássemos o lugar? – falou o mesmo homem.
- Não há nada ali dentro alem de metal
e armas velhas, é melhor irem ate o vilarejo.
- Se realmente não há nada a esconder,
então não vai se importar se olharmos, não é?
- Não é a primeira vez que nobres vem
roubar minhas coisas com a desculpa de estarem procurando alguém, não vou
deixar que entrem.
- Eu acho que você não esta entendo a
situação, se recusar, vamos ter que entrar a força e não posso garantir sua
segurança – disse o mesmo homem e seus colegas levaram as mãos ate o punho de
suas espadas.
- Não pretendia tomar partido na
guerra das duas rainhas, mas também não tinha intenção de entregar aquele
homem para eles, por isso arrebentei com
a cabeça daquele cavaleiro usando meu martelo.
Por sorte eles não estavam realmente
esperando que um ferreiro resistisse a três soldados armados, trajando armadura
completa e por isso eles ficaram parados tetando entender o que havia
acontecido. E uma sorte maior foi a de que suas armaduras não lhes davam
proteção contra meu martelo e eu pude arrebentar a cabeça do segundo antes que
o terceiro acordasse do transe e me atacasse com sua espada de duas mãos.
Tentei me defender com o martelo, mas
a força do golpe me jogou para trás e cai para dentro da forja, fazendo com que
o lobo de Augusto ficasse pronto para atacar qualquer um que entrasse pela
porta. O que foi minha terceira sorte naquela manha, pois quando o homem entrou
certo de sua vitoria, foi surpreendido por uma fera que em um pulo o jogou para
o chão e para seu azar seu elmo se soltou e a fera pode destroçar sua garganta.
Me sentei no chão gelado tentando me
recuperar de tudo o que havia acontecido, não foi a primeira vez que matei um
homem e algo me dizia que não seria a ultima, mas não conseguia me acostumar
com a sensação de de tomar uma vida e com meu coração batendo freneticamente
em meu peito.
- Obrigado – disse a mesma voz fraca
que ouvi na noite anterior e notei que ele estava acordado – Você lutou por mim
quando podia ter me entregado e por isso lhe sou grato.
- Não fiz nada de mais, você devia
estar descansado ao invés de falar.
- Você fez mais do que imagina – ele
estendeu sua mão para seu lobo lamber e de certa forma aquela cena me enjoou,
pois a boca da fera estava coberta de sangue – Qual seu nome ferreiro?
- Ulthred senhor.
-Ulthred? Eu lhe devo minha vida
Ulthred e a coroa lhe deve o futuro desta guerra.
- Perdão?
- Não posso lhe explicar, mas você fez
um grande serviço hoje – e ele desmaiou novamente me deixando mais confuso do
que antes. Mas naquele dia eu tive a certeza de que acabei me envolvendo em
algo maior do que podia imaginar e na manha seguinte parti com ele rumo ao
castelo.
De encontro a rainha e a uma decisão
que mudaria o futuro de todo o reino.
Nenhum comentário:
Postar um comentário